Alta no desmatamento faz Brasil correr risco de chegar à COP com derrotas em série 122w1q
Precisamos mudar esse cenário ou vamos chegar à conferência com um número pior do que o do ano ado 5h4k3f
O decréscimo do desmatamento na Amazônia é a principal entrega feita pelo governo Lula na agenda ambiental. É a que soa mais convincente e mais forte no mundo inteiro. 2kl69
Essa é uma agenda importante tanto pelo o que a Amazônia significa em termos de biodiversidade e clima, quanto para a imagem do País. Para o clima, porque metade das emissões que colocam o Brasil entre os dez maiores poluidores do mundo vem da destruição da floresta, e também porque a Amazônia estoca o equivalente a cerca de dez anos de emissões de gás de efeito estufa de todo o mundo. Cada vez que a Amazônia é desmatada ou ela é queimada, o clima é diretamente afetado - se a gente perde a floresta, perde a corrida para o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento do planeta a 1,5 ºC.
Essa perda atinge a imagem do País, porque há uma reação internacional muito forte a cada aumento de desmatamento da Amazônia, comprometendo, inclusive, circunstâncias comerciais do Brasil.
Os 92% de aumento do desmatamento na Amazônia anunciado nesta sexta-feira, 6, pelo Ministério do Meio Ambiente têm uma repercussão muito ruim para o Brasil. Enfraquece a posição de liderança na agenda do clima, que se vale muito do exemplo de bons números e de boas entregas. Se essas boas entregas forem caindo pelo caminho, se o Congresso continuar aprovando o que quiser sem resistência, o desmatamento continuar a subir e vai afetar negativamente a imagem do País, o que seria uma pena.
Precisamos do Brasil forte, unido em torno da agenda ambiental para receber a COP e presidir a conferência.
A posição do País influencia muito na agenda e no ritmo das negociações. O mundo vive hoje um momento muito difícil no multilateralismo, com guerras fiscais e bélicas, e precisa do Brasil concentrado em construir o avanço da agenda global de clima e dos acordos da COP. O pior cenário é gastar nossa energia brigando internamente para evitar retrocessos, em vez de usá-la para o grande processo de união necessário para a COP30 ter resultado.
O que temos hoje, em maio, é um alerta bem alto, porque não está isolado. Também houve um aumento expressivo do desmatamento em abril. Faltam dois meses para o fechamento do ciclo 2024-2025 do desmatamento - a contagem começa em agosto de um ano e termina sempre em julho do ano seguinte. O acumulado que vem de agosto ado até maio deste ano já está cerca de 10% maior em comparação com o mesmo período anterior. Nesses dois meses restantes, o governo vai precisar reverter a tendência de alta do desmatamento, com o fator especial de que junho e julho são meses extremamente secos na região amazônica, o que facilita o desmatamento.
Dá tempo de corrigir esses números; a gente sabe como fazer. Somos o País que derrubou o desmatamento em 83% na Amazônia entre 2004 e 2012 e deu um dos maiores exemplos ambientais de como reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Essa é uma memória importantíssima. É possível repetir, mas para isso precisamos corrigir nosso comportamento interno, a começar por setores do próprio governo.
Está na hora de o governo assumir o mesmo rumo: a agenda ambiental não a esse duplo comando. A postura precisa ser uma só, em defesa da agenda. Quando o governo tem uma postura única, já é difícil. Com essas contradições todas, o cenário fica muito pior. Aliás, o saldo das contradições internas do governo é esse que estamos vendo: agenda cheia de riscos de retrocesso no Congresso e floresta no chão na Amazônia. Não é que alguns atores importantes do governo se contradizem na agenda, mas muitos deles abrem fogo amigo contra.
Precisamos mudar esse cenário ou vamos chegar à COP com um número pior do que o do ano ado, portanto, com um aumento do desmatamento. Se esse número for de alta, vai se juntar a outros aspectos muito negativos pelos quais o País vem ando, nessa enorme pressão antiambiental que estamos vivendo.
A lista de retrocessos em discussão é muito grande: há o projeto de lei de fim do licenciamento ambiental aprovado no Senado e que voltou para a Câmara, a pressão pelo fim da moratória da soja - que foi um instrumento histórico muito importante de controlar desmatamento na Amazônia -- a questão da pavimentação da BR-319 a qualquer custo, ataques aos direitos indígenas em diversas formas, incluindo uma PEC que tramita agora no Congresso e uma câmara de conciliação sobre o marco temporal no Supremo, que já foi abandonada pelas representações indígenas, mas continua existindo. Fora o estudo de projetos de lei que podem ser aprovados a qualquer momento no Congresso, incluindo um que dá anistia à grilagem de terras, declinando a proteção ambiental da vegetação nativa em todo o País.
Há ainda a pressão inacreditável de setores do governo por extração de petróleo - o próprio presidente Lula fez, mas parece que voltou atrás na última declaração pública, ao dizer que processos de licenciamento causam insatisfação de um lado, mas quando o projeto é muito delicado, ele demora mesmo. Há dois meses, ele estava falando outra coisa, chamando o comportamento do Ibama de "lenga-lenga". Isso demonstra como as coisas estão dentro do governo, uma hora para um lado, outra hora para o outro.
Temos muitos riscos, que vão desde o chão da floresta até os tapetes do Congresso. É a hora do governo ficar mais unido nessa agenda, ser mais decidido, atuar com mais firmeza na proteção ambiental ou corre o risco de chegar à COP com derrotas em série.
